Os fãs de romances policiais podem comemorar: Agatha Christie está de volta às prateleiras de lançamentos. A coleção repaginada da autora, recém lançada pela Harpercollins, conta com novas traduções e novo projeto gráfico, o que deixa os livros ainda mais atraentes. As antigas traduções para o português, feitas com espaço de muitos anos entre uma a outra, nem sempre mantiveram o mesmo tom. Já as novas versões, feitas agora por um time mais coeso, garantirão mais clareza, leveza e homogeneidade ao texto. As capas seguirão o estilo fresh vintage, numa jogada inteligente para que agradem tanto o antigo público de Agatha quanto para que conquistem o público mais jovem, que a está descobrindo agora. Autora de 66 romances policiais, e mais outros tantos contos, poesias e romances de temas diversos, Christie é a romancista mais bem sucedida da história da literatura popular mundial em número total de livros vendidos, segundo o Guiness Book. Suas obras, juntas, venderam cerca de quatro bilhões de cópias ao longo dos séculos XX e XXI, cujos números totais só ficam atrás das obras vendidas do dramaturgo e poeta William Shakespeare e da Bíblia. 

A “Rainha do Crime”, como também é conhecida, sempre soube contar uma história. Mas ainda mais interessante que as histórias que ela escreveu é sua própria história de vida. Nascida em Devon, na Inglaterra, Agatha Christie teve poucos anos de educação formal. Aprendeu a ler sozinha aos cinco anos de idade, indo contra a vontade de sua mãe. Sofria de disgrafia, o que a dificultava escrever de forma legível. Aos dezoito, enquanto se recuperava de uma uma enfermidade, escreveu sua primeira história. Casou-se aos vinte e quatro anos com o Coronel Archibald Christie, piloto do Corpo Real de Aviadores, com quem manteve um romance tempestuoso. Enquanto o marido esteve na Primeira Guerra Mundial, trabalhou em um hospital e em uma farmácia, o que influenciou seu trabalho: muitos dos assassinatos em seus livros foram cometidos com o uso de veneno. Em 1919 teve com Archibald sua única filha, Rosalind. Em 1926, seu marido Archie revela que está apaixonado por outra mulher, Nancy Neele, e quer o divórcio. Deixa então a esposa, para passar um fim de semana com a amante e alguns amigos em Godalming, Surrey. Ao chegar em casa e não encontrar o marido, Agatha abandonou a casa em Styles com uma pequena mala. Na manhã do dia seguinte, seu carro foi encontrado em um barranco ao lado de um lago, com os faróis acesos. Dentros haviam sido deixados um casaco de pele, sua mala e uma carteira de motorista vencida. O desaparecimento da autora se tornou notícia em Surrey quando a polícia local publicou um relatório de pessoas desaparecidas, e passou a oferecer  £100 para quem tivesse qualquer informação sobre a autora. Mergulhadores, escoteiros e até aviões participaram da busca por Agatha, que ao todo teve a ajuda de 15.000 voluntários. Foi a primeira vez que se usou aviões para buscar alguém desaparecido na Inglaterra.Agatha Christie estava desaparecida há onze dias quando a polícia soube que ela estava no Hydropathic Hotel (hoje Old Swan Hotel), em Harrogate. Ela havia chegado de táxi no dia 4 de dezembro levando consigo apenas uma mala e estava hospedada sob o nome de Teresa Neele (o mesmo sobrenome da amante do marido), dizendo ser da Cidade do Cabo e explicando que era uma mãe de luto pela morte de seu filho. No hotel, Agatha foi vista dançando, jogando bridge, fazendo palavras cruzadas e lendo jornais. Curiosamente, a autora deixou um anúncio no The Times dizendo que Teresa Neele procurava parentes e amigos da África do Sul.  Várias teorias foram criadas para explicar o falso desaparecimento da autora. Algumas pessoas defendem que o escândalo foi um golpe publicitário para aumentar a venda de um dos seus livros, lançado semanas antes do desaparecimento. Outras, que a intenção da autora era apenas de se vingar de Archibald, simulando sua morte para que o marido fosse acusado de assassiná-la. FInalmente, há os que dizem que a autora realmente sofreu um acidente de carro e perdeu a memória. 

O mistério do desaparecimento de Agatha Christie nunca chegou a ser totalmente desvendado. Mas o mistério da razão pela qual seus livros vendem tanto, e estão sendo reeditados atualmente, sim. As histórias de Agatha são perfeitas para o momento pelo qual passamos. Seus personagens com personalidades claras e bem definidas trazem refresco em uma era de tantas incertezas. O enredo de mistério combina com o momento de insegurança que atravessamos, então suas histórias dialogam com o leitor atual. Mas por serem escritas de forma leve (os crimes retratados em seus livros já foram chamados de “crimes confortáveis” ou “crimes brandos”) e todos serem resolvidos de forma lógica com a punição dos culpados e exaltação dos heróis, deixam no leitor uma sensação agradável de segurança. E talvez a genialidade de reeditar Agatha agora resida aí: no trazer aos leitores uma dose saudável de escapismo, que vem muito a calhar no mundo pós-pandemia.   

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